sexta-feira, 19 de abril de 2013

O cacique Jurubeba

Ele chegou à cidade há meia-noite e vinte. Isso constatado pela tia Cotoca, que estava tomando um ar porque não conseguia dormir.
Não que ele tivesse vindo aparatado como índio, mas a tia em questão observou a chegada daquele homem alto e estranho à vizinhança.
Era uma cidade com porte médio e tinha lá a sua importância por ser a mais próxima à capital e foi exatamente nela que o cacique Jurubeba resolveu aportar.
Saiu do táxi com uma mochila às costas e uma mala grande, com rodinhas, arrastando-a pelo chão enluarado e sob o olhar da curiosa Cotoca.
No dia seguinte, as figuras mais eminentes daquele município já estavam a par do novo morador, que ocupara a casa dos Silva- que se mudaram para a capital para o filho ficar mais próximo da Universidade. Branca, grande, com duas entradas amplas e um jardim de dar inveja nos vizinhos, ali fixou-se a sede dos trabalhos do cacique.
Após uma semana parou à porta da casa um carro chiquérrimo, de onde saiu uma loura platinada, com óculos escuros, na casa dos cinquenta anos, sendo conduzida pelo motorista, impecavelmente trajado e, pasmem(!), ele também usava um perfume francês caríssimo.
A dama olhou furtivamente para os lados, torcendo internamente para não possuir conhecidos nas cercanias e atravessou o enorme portão de ferro, do séulo XIX.
O motorista permaneceu no lado de fora, encostado no automóvel e atento a qualquer movimento em direção à casa do cacique Jurubeba.
De dentro do imóvel só se ouviam poucos ruídos e um leve odor de lavanda foi sentido. No restante, era um silêncio ensurdecedor.
Uma hora e meia após a chegada, a loura platinada saiu, com um largo sorriso no rosto, enxugando as lágrimas que persistiam em sair dos olhos. Recobrou a majestade e colocou os óculos, sendo novamente conduzida ao carro e partiram, deixando o cacique à porta, com o peito nu, umas palhas amarradas aos braços e calças brancas, de um tecido levíssimo. Descalço, deu três batidinhas na sola dos pés, gritou umas palavras desconhecidas e entrou na casa, fechando o portão atrás de si.
Foi o suficiente. A coroa em questão foi até ele pedir o retorno do marido, que havia fugido com uma jovem de dezenove anos e CONSEGUIU o feito, tornando o cacique Jurubeba uma coqueluche social.
Todos os dias eram mulheres e homens, entrando e saindo do imóvel, com pedidos os mais variados: vencer as eleições municipais, estaduais e até federais; não serem cassados - após eleitos - por prevaricação, conseguir casar - preferencialmente, com um rico (ainda existe isso!), passar em concurso público e cura para as mais incríveis moléstias.
E o cacique Jurubeba lá, firme e forte, trabalhando para o "bem da população" sendo que, infelizmente, os valores cobrados não eram para o povo, assim, no geral.
E era uma felicidade! O cacique Jurubeba teve que contratar ajudantes, gerando empregos na região: arrumadeira, cozinheira, copeira, dois seguranças- afinal, personalidades da sociedade frequentavam a "modesta" sede do Jurubeba e um motorista. Claro! O cacique não teria "forças" para dirigir após tanto trabalho espiritual. Alguém enfrentaria o trânsito por ele. Uma pessoa menos Jurubeba de ser.
Para os que não eram atendidos, o cacique tinha respostas perfeitas para todos os questionamentos:
" Filho, aguarde o SEU momento no cosmos".
" Filha, este homem será seu quando VOCÊ se abrir para a natureza".
" A doença já está saindo de você. E se ainda não está curada, é porque LHE falta fé".
Bom, o cacique não cometia erros. Qualquer problema, era com VOCÊ!
Numa tarde rolou um bundalelê geral, como narrou a veterana Cotoca, que da janela acompanhou tudo. Tudinho!
A polícia cercou o quarteirão, com atiradores de elite posicionados em telhados e coberturas de edifícios, homens com os rostos cobertos com máscaras de esqui- pretas- daquele tipo que faria qualquer mulher suspirar, trazendo para fora, algemado com as mãos às costas, o cacique Jurubeba.
Havia duas socialites, no momento, que se preocuparam em cobrir os rostos e corpos nus, não necessariamente nesta ordem, que igualmente saíram enroladas em lençóis brancos, sob o espocar dos flashes e as palmas da garotada de doze/treze anos.
Ninguém entendeu nada, mas no mesmo dia estava na internet, para quem quisesse ler:
" Preso Ademílson dos Santos, também conhecido como: Doutor Vilella- médico; Professor PHD em astrofísica Ruy Beiral; Príncipe exilado Varamesto D'Ippaglia e... cacique Jurubeba", sendo a última identidade a que, de longe, foi a mais rentável.
O tal do meliante tinha uma folha de antecedentes criminais que, bem esticada, daria duas voltas no município onde estabeleceu a sua sede.
É... O sujeito está, por enquanto, no xilindró, detido por exercício irregular da profissão, falsidade ideológica, estelionato e roubo de galinhas(?). Enfim, o Ademílson era assim.
Mas ele se arrumou na cadeia. Ah, isso ele era, de fato: CRIATIVO.
Imeditatamente reativou o seu ar majestático quando, nos dias de visitação, passou a ler a sorte nas cartas, dando a certeza das mesmas dúvidas de sempre:
" Claro que seu marido vai voltar. Sai daqui em poucos meses!"
" Homem! Ela é fiel, mesmo você preso!"
" Tá grávida de um menino. Pode confiar!"
E assim ia, entre acertos e erros. Mas claro: se desse errado, o problema era SEU!
Beijos mil,
Adri.





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