terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O efeito "UAU!"

Isaurinha vivia um casamento arrastado pelos anos. Tentava explicar ao marido, o Dagoberto, que perderam o efeito "UAU!". Claro que o coitado não conseguia entender absolutamente nada do que ela falava por horas, discutindo a relação. Mas o que a moça tentava explicar é que o casamento ia morno, com velas meio murchas e marolas ao invés de ondas poderosas. Queria novamente a emoção dos primeiros beijos, as gargalhadas sem motivo e a calcinha jogada pela janela do carro. Sim, meus queridos leitores. Isaurinha, quando namorada de Dagoberto, adorava jogar a calcinha pela janela do possante apenas para vê-lo em desespero. Geralmente quando paravam ao lado de um ônibus ou de um carro com um velhinho tarado. Conhecem o tipo, né?! Fingem que não estão olhando mas, quando o casal percebe, o velhinho está quase lambendo a janela do Ford Bigode.
Pois é. O casamento já não tinha estes encantos. Acrescentou outros, mas perdeu estes. Dagoberto ficou sério e confundiu maturidade com velhice de alma.
E Isaurinha recebeu este nome em homenagem ao romance "A escrava Isaura", que a mãe lera e amou a protagonista. Uma escrava branca que sofre como azeitona em boca de desdentado, ou dinheiro miúdo em mão de bêbado. Mas a moça em questão era arrepiada e de escrava nada ostentava.
Certa noite resolveu inovar. Comprou botas de canos tão altos que quase não se viam as suas pernas, exceto por uma faixa abaixo do biquini de couro preto. Pôs uma máscara no estilo "mulher gato", um sutiã pontudo, capaz de cegar qualquer um que estivesse na Sibéria e um...chicotinho.
Danou-se a noite do Dagoberto. O pobre diabo chegou em casa estropiado. Naquele dia o chefe brigou com ele, ele descontou no colega, chamou a garçonete de gorda- claro que não pretendia isso. Apenas observou: "dona Margarida, a senhora está mais para um Girassol", no sentido que ela iluminava o ambiente. Não funcionou. A coitada era rotunda e saiu chorando. O chefe tornou a chamar a atenção do coitado e, ao encerrar o dia de provações dignas de vestibular para santo, tropeçou na escada e caiu por sobre uma velhinha com andador.  Foi um final apoteótico.
Pois então. Exatamente neste dia- leia-se noite- a Isaurinha resolveu aquecer a relação.
Deixou a porta do apartamento entreaberta, um caminho de velas perfumadas que levavam até o quarto, totalmente escuro e...vazio.
" Isaurinha, meu bem, cadê você?", meio cabreiro, esperando um assalto. Mas um assaltante não iria recebê-lo com velas aromáticas.
De um canto pulou a mulher que num golpe fantástico postou-se à frente do Dagoberto.
Ele a olhou de cima a baixo. Ficou na mesma e fez o comentário maldito, às gargalhadas: "Já chegou o Carnaval?!" e explodiu o dia difícil numa gargalhada de espantar coruja desprevinida.
Ah, pra quê... A mulher virou bicho e mandou o chicote em cima do homem. Como o quarto permanecia no escuro, ele tentava escapar pulando os móveis mas, por ser pouco atento, tropeçou na cadeira, caiu por sobre o cabideiro, escorregou no tapete, chutou o cachorro que apareceu por conta da algazarra- pobre do "Titã", um Yorkshire de um quilo e meio- e "shlap", tome chicotada no lombo.
Machucado ele não ficou por conta do chicote, que era desses de sex shop, mais para brincar. Mas pelos tombos, aí sim, o Dagoberto virou uma berinjela gigante.
Claro que ele foi dormir na área de serviço e o "Titã" coitadinho, junto à Isaurinha.
O dia seguinte foi funesto. Café da manhã sem um bom dia- por parte da Isaurinha, porque ele tentava até se explicar- e o Yorkshire resolveu, "estranhamente", fazer as necessidades sobre os sapatos do Dagoberto, que só percebeu quando os calçou.
É isso aí. O efeito "Uau!" às avessas.
Mas, dizem os antigos, que a "necessidade é a mãe de todas as soluções" e o Dagô- já estamos íntimos do sujeito, oras!- resolveu virar o jogo.
Passou a chegar tarde em casa, sério, sem palavras. Um beijo seco, banho e cama- para dormir.
Isaurinha ficou intrigada após duas semanas deste comportamento. Resolveu segui-lo.
Ah... quando viu o letreiro " Tropical stripper man" gelou.
Entrou meio acanhada, agradecendo por estar com calcinha. No palco homens se revezavam com trajes que povoam os sonhos de muitos homens e mulheres- o mundo agora é PAN gente!- quando ouviu o anúncio: " Agora, a sensação da noite Betão, o bombeiro da luxúria".
O mulherio enlouqueceu e Isaurinha quase infartou. Tinha turista pondo nota de cem dólares na sunga do Betão- o Dagoberto!- subindo ao palco e fazendo umas dancinhas que mais pareciam ritual de acasalamento primitivo.
E Betão lá, todo solto, no efeito "UAU" que gerava no público.
Isaurinha não conversou. Arrancou o Dagoberto/"Betão" do palco e chamou as moças mais afoitas de bonitas para baixo e sentenciou: "quando chegarmos em casa, tem conversa".
E lá foi o rapaz, sorridente, puxado pela esposa e mandando beijinhos para as fãs, vestindo a sua sunguinha vermelha.
Em casa, reabilitada dos cinco segundos de loucura, Isaurinha começou:
" Pode me explicar esta depravação apocalíptica e insandecida, criatura."
" É o efeito "UAU!", rindo de si mesmo, estirado no sofá e brincando com a mangueira de bombeiro.
Bom, nem preciso dizer que o coitado do "Titã"- para o próprio bem- passa as noites recluso na área de serviço e no quarto do casal, as luas são cheias, os mares revoltos e o efeito "UAU!" rola à solta, com bombeiros, dominatrix e outros bichos mais.
Beijos mil,
Adri.

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