" Mãe, de onde vem os bebês?"
Com dois pigarros estratégicos, Maitê se mantém calma e responde, enxugando um pingo de suor furtivo- " Filho. Vem da barriga das mães", com um tom falsamente distraído.
" Isso eu já sabia e também sei que o doutor opera a barriga e tira o neném de lá, todo cheio de s-a-n-g-u-e!", dando um sorrisinho sádico e olhando, nas pontinhas dos pés, o molho em fase de agonia sobre o fogo.
" Então não estou entendendo a sua pergunta, Jorginho! Afinal, se você já sabe de tudo, vai brincar lá fora com o Gabriel e me deixa em paz, que o molho já está pegando no fundo da panela", secando mais dois pingos de suor, com um certo nervosismo.
Maitê pensava, enquanto mexia com exaspero o molho- este molho, para mim, já está condenado... prosseguindo- porque não havia comprado aqueles livros pedagógicos sobre sexo, que facilitam a vida dos pais nessas horas.
Nisso chega à cena o pai do pequeno Jorge: o Jorjão!-vindo do futebol de pernas-de-pau de todo domingo, onde os casados- e pançudos!- se contorcem contra os atléticos solteiros e levam, como de costume, uma surra de gols. Mas o que importa é a cervejada que corre solta durante o "clássico" quando, na última partida, o juiz teve que ser retirado do campo, apoiado em dois zagueirões, de tão encachaçado que estava- e só haviam passados quinze minutinhos do início da pelada!
Enfim, Jorge pai chegou feliz, suarento, com cheiro de gambá em decomposição e "tenta" beijar Maitê, que o repeliu-como habitual- com um empurrão e com água benta. Bem, a água benta é um exagero da minha parte, mas o cheirinho merecia.
" Pai! Ô paiê!"
" Grande Jorginho! O pai mandou bem no jogão de hoje. Fiz um golaço!"
Deixe-se claro que, por conta do "golaço", o seu Jorge quase destroncou o corpo inteiro e foi gol contra. Continuando, o Jorginho atacou com a mesma pergunta e o Jorge pai tomou um gole de cerveja antes de responder o mesmo que a Maitê.
" Puxa vida! Eu quero saber C-O-M-O ele vai parar lá", com as bochechas tão vermelhas quanto o molho.
No momento em que o Jorjão ia se aprumar para falar a verdade, Maitê interveio e explicou:
" Filhinho. As pessoas que se amam muito e namoram, acabam produzindo uma semente que é posta na barriga da mulher. É assim que os bebês vão parar nas barrigas das mamães, querido".
Sintam que este "querido" saiu com um tom de "filho da p...", porque a pobre mulher estava com TPM, o marido cheirando a gambá morto, a família chegando para o almoço em poucos minutos e o moleque estava azucrinando a vida da coitada, que fez três tipos de molho para a massa e, pelo visto, não haveria um que prestasse.
Enquanto procurava o telefone do delivery de pizza- caso ocorrese o pior- Maitê matutava C-O-M-O o Jorginho veio com esta pergunta.
" Manhê... Ô manhê!"
" QUE FOI, J-O-R-G-I-N-H-O?"
" Fala aí sobre a sementinha. Como ela é colocada na barriga?"
Jorjão estufou o peito e começou o repertório:
" Filhão. A situação é a seguinte: nós, homens, temos uma coisa a mais que as mulheres e quando nós ficamos muito felizes em ver- as mulheres- essa coisa..." e antes que terminasse a explanação foi, digamos, atacado com uma colher de pau pela Maitê, que sentenciou o Jorjão:
" CHUVEIRO JÁ!", como uma líder sindical enlouquecida.
O Jorginho ficou mais intrigado. Qual seria esta "coisa" a mais que o pai ia dizer e a mãe mandou o coitado tomar banho. Sim, porque o menino achava banho um castigo medieval.
Continuou ao redor da mãe, pensando muito e lascou novamente:
" Mãe. Mãe. Mãe!"
" QUIÉ Jorginho. Eu estou toda atarefada, a chapinha que eu fiz no cabelo já foi para o espaço e daqui a pouquinho os seus tios e avós estarão aqui e por SUA causa os molhos estarão imprestáveis".
E assim foi. As famílias chegaram para o almoço de domingo e Jorginho, após os cumprimentos de praxe e a limpeza da bochecha ( havia uma avó que o babava quando dava beijinhos...), lançou a pergunta maldita:
" Gente! C-O-M-O os bebês vão parar na barriga das mães e o que é isso que NÓS homens temos que ficam felizes com as mulheres e..."
Antes que o menino terminasse a família estava em polvorosa. Maitê suava e corria para as panelas, porque, agora sim, não sobrara nenhum molho; as avós ficaram num tom vermelho-púrpura e diziam que era coisa da internet, que as crianças hoje não brincam de roda e não sabem soltar pião; os machos-alfa, mais velhos, estufaram os peitos e riram a valer com a pergunta do netinho e só faltaram acender charutos em comemoração ao novo macho da matilha.
E no meio dessa história, Jorginho ouviu o Gabriel chamar e se retirou sem que ninguém percebesse.
" Então, conseguiu saber?", perguntava o menino.
" Que nada... Acho que é porque eles são muito velhos e não sabem mais. Esquecimento é coisa de gente mais velha, não é?!", ponderou sabiamente o Jorginho.
" É. Lá em casa também ninguém sabia o C-O-M-O. Acho que é porque a minha mãe já não tem um bebê, na barriga, desde a minha irmãzinha Amélia, há três anos. Deve ter esquecido como foi..."
" Vamos na casa do Alex! A mãe dele está com o maior barrigão e COM CERTEZA ainda se lembra como a tal semente foi parar lá dentro".
E assim correram os dois meninos pela rua e atravessaram a pracinha, em direção a mais uma casa serena, onde o prato do dia seria "macarrão e confusão".
Beijos mil,
Adri.
DIVERTIDO, SENSÍVEL e REAL. Amo seus textos! SENSACIONAL! Beijos
ResponderExcluirOlá, Elis!
ExcluirTambém sou fã dos seus textos e agradeço muito os elogios feitos. Espero se merecedora da intensidade deles!
Beijos mil,
Adri.
Foi com um sorriso nos lábios que li este seu texto. Aconteceu algo semelhante com o Gui, tinha ele 5 aninhos... Muito bom o seu texto, como sempre.
ResponderExcluirBeijos, querida Adriana
Lúcia
Querida Lú!
ExcluirQue coincidência o meu priminho ter feito algo semelhante. Só espero que não tenha havido tamanha confusão no almoço de domingo.
Obrigada por ser, além de prima amada, minha leitora assídua.
Continue com o sucesso no seu blog:www.protocoloeetiqueta.blogspot.com
Beijos mil,
Adri.